Enterrados no Jardim

著者: Diogo Vaz Pinto e Fernando Ramalho
  • サマリー

  • Diogo Vaz Pinto e Fernando Ramalho à conversa, leve ou mais pesarosamente, fundidos na bruma da época, dançando com fantasmas e aparições no nevoeiro sem fim que nos cerca, tentando caçar essas ideias brilhantes que cintilam no escuro, ou descobrir a origem do odor a cadáver adiado, aquela tensão que subtilmente conduz ao silêncio, a censura que persiste neste ambiente que, afinal, continua a sua experiência para instilar em nós o medo puro. Vamos desenterrar, perfumar e puxar para o baile os nossos amigos enterrados no jardim, e deixar as covas abertas para empurrar lá para dentro aqueles que só aí andam a causar pavor e fazer da vida uma austera, apagada e vil tristeza.
    © 2024 Enterrados no Jardim
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あらすじ・解説

Diogo Vaz Pinto e Fernando Ramalho à conversa, leve ou mais pesarosamente, fundidos na bruma da época, dançando com fantasmas e aparições no nevoeiro sem fim que nos cerca, tentando caçar essas ideias brilhantes que cintilam no escuro, ou descobrir a origem do odor a cadáver adiado, aquela tensão que subtilmente conduz ao silêncio, a censura que persiste neste ambiente que, afinal, continua a sua experiência para instilar em nós o medo puro. Vamos desenterrar, perfumar e puxar para o baile os nossos amigos enterrados no jardim, e deixar as covas abertas para empurrar lá para dentro aqueles que só aí andam a causar pavor e fazer da vida uma austera, apagada e vil tristeza.
© 2024 Enterrados no Jardim
エピソード
  • Sentir no ar outra coisa além do perfume de adeuses. Outra conversa com Nuno Ramos de Almeida
    2025/01/01
    É difícil saber como se atravessa o nada deste arco, essa linha invisível do ano novo. Não há uma porta, talvez só um buraco, de um lado e do outro: o mesmo. Olhamos em volta, e, nas ruas, por toda a parte, menos do que um fantasma, só uma bruma retardada. Desde há um tempo já não há começos, e, deste modo, apoiamo-nos em rituais desgastados, e em todas as nossas manifestações apenas se exprime um cansaço fundamental. “Há no ar como que um perfume de ‘adeuses’”, notava Steiner. “A cronometria íntima, os contratos com o tempo, que em tão larga escala determinam a nossa consciência, indicam o fim da tarde sob formas ontológicas: que se referem à essência, ao tecido do ser. Chegámos tarde. Ou temos pelo menos a impressão de ter chegado tarde. A mesa foi levantada. ‘Vamos fechar, minhas senhoras e meus senhores, vamos fechar.’” E, no entanto, o castigo maior talvez seja precisamente a forma como tudo persiste, se arrasta. Sobre estes ciclos que não assinalam qualquer ímpeto nem um vago ânimo de revitalização, os nossos ‘cronistas’ dirão alguma bacorada num tom vagamente sarcástico, reduzindo-se todo o seu arsenal retórico a essa faca romba, mas descontando esses que se especializaram em produzir discursos que dão tudo como natural, e não assumem perplexidade ou espanto, nem muito menos ainda exprimem qualquer repúdio violento ou furor seja pelo que for, podemos socorrer-nos daqueles exemplos cada vez mais distantes dos seres comprometidos com um verdadeiro quadro de regeneração, revoltando-se diante desses elementos cerimoniais que só funcionam como aspectos de uma auto-ilusão. Tendo chegado ao nosso convívio este ano, por meio de uma generosa e instigante antologia, José Emilio Pacheco mediu bem essa estéril fanfarra no poema “O Novo Ano”: “O novo ano não bate à porta, não cumprimenta ninguém, fita-nos com a arrogância de quem nos tem nas mãos. Troça dos nossos intentos de cativá-lo. Pulverizará as boas intenções. Tem gozo no seu poder, sabe-o efémero, conhece as desgraças que sem equidade distribuirá, como sempre./ Na sua jurisdição de vida e morte, o novo ano arrasará tudo, não deixando sequer uma flor seca para o sentimentalismo da lembrança. Atropela com soberba de vencedor a nossa frágil dignidade, nós que o inventámos e que para ele erguemos um altar.” Estas cerimónias, na verdade, são uma convocação, uma dança da chuva tentando vincar o tempo, num esforço para exorcizar os aspectos dolorosos, e resguardar aqueles elementos que seria decisivo para nós preservar. Nesta devoção aos signos da temporalidade, está presente esse anseio constante de se transformar, e que é particularmente agudo nos momentos em que nos domina a impotência, e as circunstâncias nos fazem sentir descartáveis, imemoráveis. Em períodos em que somos forçados a comer as nossas derrotas, em que se não fosse por elas não teríamos mais nada, quando parece que os dias já nascem sujeitos a um efeito de escassez, dissipação, fez-se-nos imperioso sobreviver a uma época que não nos promete outra coisa senão mais do mesmo. Se nos debruçamos sobre os tímidos reflexos que observamos lançando um olhar sobre o futuro, logo o nosso vocabulário parece gasto, demasiado breve, balbuciando palavras como “ausência”, “esquecimento”, “indiferença”, “distância”. “E nunca mais, nunca mais, nunca, nunca”, acrescenta Pacheco. Parece sempre um tanto ridículo o presente que nos carrega, e nos obriga a rir do nosso aspecto. “Quão jovens, quão infantis parecem todos.” E até a morte parece ter mudado, não produzindo grande efeito no modo como interrogamos e convivemos com os nossos mortos. Há a notícia, depois uns vagos clamores, e depois uma incerteza sobre onde se está, quantos somos… “Agora mata-nos a velhice./ Agora entretém-nos/ a doença/ com um tabuleiro de esperança./ Agora por um instante a loucura/ parece mais serena.// Muito descansados, alimentados, vamos/ caindo um a um.” Toda a cultura reverteu em estratégias para maquilhar as expressões de desânimo, tudo tem apenas uma consistência efémera, actuando como uma distracção, sendo que o vício em paliativos começa muito antes de escutarmos a pulsação desse coração negro que acaba por devorar o outro. Neste primeiro episódio de 2025, gravado umas horas antes, não quisemos perder demasiado tempo com esses souvenirs da nossa dissolução nem com os brinquedos cuja função é estender essa segunda e desgraçada infância. Preferimos vadiar e afinar os instrumentos para espectáculo nenhum, virados para a hipótese de um mundo que de si mesmo nasça, impelido por este “atordoamento múltiplo/ estranheza/ de estar aqui, de ser/ numa hora tão feroz/ que nem sequer tem data”. Continuamos a assumir a nossa fragilidade, a admitir que se perdeu o mundo e não sabemos “quando começa o tempo de começar de novo”. A par de ...
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    3 時間 40 分
  • Luigi Mangione, um juiz selvagem em tempos de injustiça. Outra conversa com Luhuna Carvalho
    2024/12/27
    Não seria mau se, em vez de João e Maria, na lista dos nomes mais populares dados aos recém-nascidos surgissem nos próximos anos Greta e Luigi, em honra a essas figuras capazes de nos despertar para o escândalo do nosso modo de vida. Antes que nos seja possível reconhecer a necessidade do regresso da vingança como parte activa e meio de restituição do “princípio de coesão íntima do mundo” (Goethe), devemos começar por reconhecer como fomos expropriados dos elementos mediais, como não somos hoje capazes de produzir nem ecos nem reflexos, ou de obter uma representação da nossa experiência, configurando as virtudes e os modelos de existência humana que nos parecem adequados a habitarmos a terra de forma digna. “Há uma razão para vivermos encarnados”, como assinala a poeta Jorie Graham. “Aquilo que identificamos como o entorpecimento da vida quotidiana talvez não seja mais do que a sensação de incapacidade de formarmos experiências a partir das vidas que levamos, uma vez que estas em grande medida contornam o uso da panóplia de sentidos a que chamamos corpo, viciados como estamos nos ecrãs e nos atalhos sensoriais, nessas simplificações excessivas e que são próprias da realidade virtual. Não há nenhuma ideia cuja veracidade possa ser aferida se não passar pelos sentidos. Referimo-nos amiúde àquilo que mais nos une numa experiência partilhada como o nosso “senso comum”. Este era ou foi o nosso detector de mentiras.” Hoje sentimo-nos a viver existências degradadas ou demasiado parciais porque passamos a vida a tentar filtrar presunções fraudulentas, simulacros que induzem em nós esse estado de confusão e compram a nossa passividade por meio de vantagens materiais. Neste contexto, a própria moral é uma falsificação, pelo que aquilo que se exige de nós são todos os actos possíveis e imaginários de traição, em que cada instante significa um instante fatal, uma contradição activa no sentido que lhe dá Sartre, e que institui o tempo do rapto, da passagem, desse movimento do que se recusa a criar uma imagem fixa da vida. “Trair deriva do termo latim Tradere, que significa entregar, fazer passar, que, por acréscimo, veio a designar: abandonar, denunciar, desertar. Uma deslocação que implica uma fractura na ordem de pertença, uma ruptura no tempo.” Quando tudo ao nosso redor contribui para a estigmatização de actos de rebeldia, até de autodefesa, cumpre-nos corporizar essa expressão monstruosa que manifesta um repúdio inequívoco pelos aparelhos repressivos cada vez mais omnipresentes, e desde logo por superar todos esses impedimentos feitos de inércia, tabus e conformismo, recuperando a dignidade e a memória das lutas passadas, ao mesmo tempo que criamos “as nossas próprias leituras e narrativas, independentes daquelas ditadas pelas instituições e pelos meios de comunicação” (Rolando D’Alessandro). A partir do momento em que constatamos que vivemos hoje subjugados a esse impiedoso estado de excepção regulado de acordo com as necessidades dos mercados, num processo de financeirização coerciva de todos os planos da existência, somos levados a reconhecer que as situações político-morais que enfrentamos foram inteiramente deslegitimadas. E, como nos diz Sloterdjik, chegado esse momento, o que se chama existente deve ser sujeito a uma profunda revisão e, eventualmente, demolição. “Assim sendo, haveria que traduzir algo diferentemente a fórmula militante de Sartre para o século XX, ‘on a raison de se révolter’: quem tem razão não é aquele que se revolta contra a ordem existente, mas o que se vinga dela.” “No que diz respeito às implicações dos estados de excepção vingadores, o nosso estudo deve começar pela questão de saber de que maneira se pode pensar a transformação da cólera agora em vingança aplicada”, adianta o filósofo alemão. Agora sim era preciso que cada um de nós se solidarizasse com Mangione no momento em este apertou o gatilho para sacudir deste mundo o CEO da UnitedHealthcare. “Os nossos carrascos criaram-nos maus costumes”, eis uma constatação desgostosa de Grachus Babeus de que se serve Simone de Beauvoir para reconhecer o elemento de degradação moral a que os franceses se viram conduzidos durante o período da ocupação nazi. “Também nós, em face dos traidores que eram seus cúmplices, vimos brotar nos nossos corações sentimentos venenosos, de que nunca tínhamos saboreado o gosto." No ensaio “Olho por olho”, ela frisa que a partir do momento em que um homem se aplica a degradar de forma deliberada outro, tratando-o como uma coisa, e fazendo-o para seu proveito, “faz rebentar na terra um escândalo que nada pode compensar; é o único pecado contra o homem, mas desde que se cometeu nenhuma indulgência é permitida e pertence a qualquer homem o direito de o punir”. E, noutro momento, acrescenta: “É necessário punir sem ódio, dizem-nos. ...
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  • Da missa de galo à cabidela do costume. Uma conversa com Cristina Carvalho
    2024/12/24
    Àqueles a quem o Natal diz muito pouco ou mesmo nada, o avesso das expectativas, esse sentido que nasce de tanto se tocar o mundo de fora, de interpretar um elemento de desordem, um modo de alegria tão apropriada à realidade como uma traição, seria embaraçoso tentar falar dessa sensação absurda de paz de que gozámos alguns enquanto crianças, estando entregues à espera, a uma difusa ansiedade, enquanto numa sala ao lado os adultos, em grande número, falavam entre si, defendendo essa mística da possibilidade de se crescer com este mundo, e de isso significar uma expansão dos elementos de fantasia, quando a própria infância se confundia com um território defendido e em cujos limites, a imaginação se permitia todo o tipo de exageros. Mas não ficava tão longe assim do momento em que tantos mestres acabam por revelar-se meros vigaristas. Depois ainda há um outro lado, e uma outra realidade onde os adultos são eles mesmos seres roídos, e a quem agrada impor a sua experiência misturando em cada conhecimento que se transmite uma dose de crueldade. Esses não atardam aquela sabedoria que vem a degradar-nos, mas trabalham-na eles mesmos para os seus fins. Neste quadro em que uma criança se pode tornar a presa de um ser imensamente frágil e que sobre ela exerce a sua infecta potência, Tove Ditlevsen descreveu a infância dizendo-nos que esta é comprida e estreita como um caixão, e não se pode escapar dela sem ajuda. “Ninguém escapa à infância, que se cola a cada pessoa como um odor. Pode-se nota-la nas outras crianças – e cada infância tem o seu próprio cheiro. Não se conhece o próprio cheiro, e por vezes teme-se que seja pior do que os outros. Fala-se com uma rapariga cuja infância fede a cinzas e carvão e, de súbito, dá-se um passo atrás quando se sente o fedor da própria infância. Observa-se, à socapa, os adultos (…). À vista desarmada, não se nota que tenham tido, outrora, uma infância, e não há quem se atreva a perguntar-lhes como conseguiram ultrapassá-la sem que ela lhes marcasse o rosto com cicatrizes profundas. Assim, facilmente se suspeita de que se tenham servido de um atalho secreto e adoptado a sua forma adulta muitos anos antes de chegar o momento certo. Fizeram-no num dia em que estavam sozinhos em casa, quando a infância lhes oprimia o coração.” É quase certo que, se a muitos lhes fosse dada a possibilidade de regressarem, veriam já tudo de forma diferente, e mesmo que reconhecessem o esforço dos mais velhos para não se tornar aparente como a vida chega a parecer-se com uma cerimónia em que tudo parece desmoronar-se perpetuamente enquanto aqueles que dão por isso se empenham para que alguns possam gozar o intervalo dessa consciência. De algum modo, a muitos de nós já não escaparia a forma como os próprios pais viviam refugiados nessa capacidade de editar o mundo para os filhos. Vimos desse castigo suave, brando, benigno. Mas só fomos felizes enquanto alguma coisa nos era escondida. A verdade é que nenhum prazer neste mundo deixa de impor um custo, nada do que nos foi dado emergiu de forma espontânea, e de graça. Há um peso que fica e vai corroendo aquele que segurou os indícios de uma desolação que nos cerca desde a primeira hora. Não há aqui uma negatividade, mas o reconhecimento de que todo o abrigo e consolação teve um preço. Pode demorar uns bons anos, mas mais tarde ou mais cedo damo-nos conta de o ritmo da existência é o da perda. E para muitos pode mesmo ser difícil conciliar esse avanço que nos foi dado, essa margem da alegria que nos foi permitida por esses que preservaram para nós um território inexpugnável, para que o mundo não aplicasse sobre nós os seus métodos de extorsão. Esse precioso equívoco conferiu-nos essa facilidade de nos destacarmos da realidade, sermos bichos de outro mundo, produzindo essa orla que mais tarde nos parece que veio a ser apropriada para efeitos de publicidade. Os tons garridos que agora tomam conta dos anúncios, tudo isso devolve a sinceridade daqueles devaneios na sua forma mais destituída, podre. Como se todo aquele vagar, que fez de nós seres para quem o tédio chegava a ser a pior das ameaças, tudo esse programa que subsidiou em nós o espírito, viria depois a projectar-se como uma radiografia revelando o lado vazio, o motivo porque havia nos adultos sempre um silêncio, uma espécie de reserva, como se não nos pudessem dizer demasiado, como se a partir de certos limites houvesse um risco de a lógica animosa que nos nutria se virar contra si própria. Os mais hábeis em traçar essa fronteira, e defendê-la, reconhecem que teremos tempo para atingir o esqueleto cinzento e eterno que está por baixo. Para alguns, o resto dos dias poderá muitas vezes trazer a sensação de se estar tomado pela sufocação, enquanto, desde a infância, vamos escavando a constatação do nosso cadáver. Mas, assim mesmo, o Natal regressa muito mais tarde, nessa ...
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